top of page
Buscar

UMBERTO SCIDA - “O REI DA OPERETA” NA ITÁLIA

A soprano greco-brasileira Susie Georgiadis, nossa correspondente na Itália, entrevista o cantor


Placência, Itália, 08 de abril de 2020


Considerado por unanimidade “O Rei da Opereta” na Itália, é reconhecido por ter renovado e transformado esse gênero, conquistando um público amplo, de todas as gerações. É “Musical Performer”, formado na Academia “B.S.M.T.- The Bernstein School of Musical Theater” de Bologna. Em sua carreira, participou de 23 temporadas teatrais, em 26 papéis como protagonista e, entre eles, 10 como diretor de cena. Do Musical à Comédia Musical, passando pela Opereta, Umberto Scida se dedica também a concertos nos gêneros jazz e swing e de música napolitana clássica. Venceu o Primeiro Prêmio “Operetta” 2012 como “Herdeiro da Grande Tradição da Opereta Italiana”. Foi selecionado pelo Maestro Luciano Pavarotti para interpretar o Musical RENT, produzido pelo mesmo Pavarotti e representado na Broadway, sob a direção de Michael Greife e in tournée na Itália de 1999 a 2001. Primeiro Ator e Diretor de Cena da Companhia “Teatro Al Massimo” de Palermo, dirigido por Aldo Morgante foi, anteriormente, também Primeiro Ator, Diretor Artístico e de Cena da histórica “Compagnia Italiana di Operette”, a mais antiga e importante companhia musical da Itália, conhecida também fora do país. Representou a Itália no Japão durante o tour “Hit Songs Festival”, apresentando-se em concerto com um repertório de músicas napolitanas e tradicionais italianas. Além da atividade teatral e de concertos, é apresentador em espetáculos e eventos e ensina em diversas instituições na Itália.


Confira, a seguir, a entrevista feita com o cantor pela soprano Susie Georgiadis, com exclusividade para a Agenda Lírica!




AL: Como iniciou a sua carreira na Opereta?


US: Tudo começou de maneira casual. No ano de 1997, obtive o diploma na B.S.M.T. (Bernstein School of Musical Theater), a mais prestigiada escola de Teatro Musical da Itália, e participei da minha primeira audição com o propósito de atuar em uma companhia teatral profissional. Tratava-se de uma companhia de nível nacional, com várias turnês de Opereta realizadas em toda a Itália e que, para a temporada que estava por iniciar, havia decidido abrir um espaço para o Musical, solicitando à Bernstein School alunos que tivessem o interesse em participar. A audição era para o Musical “No, no, Nanette” e, para a minha alegria, fui selecionado para o papel de Tom, co-protagonista de Nanette. A partir daquele momento, comecei a fazer parte do magnífico mundo do Teatro Musical. No mesmo período, a produção da companhia me ofereceu dois pequenos papéis em duas operetas: “A Viúva Alegre” e “Cin Ci La”, convite que aceitei com muito entusiasmo e curiosidade e, em pouco tempo, me vi apaixonado pela Opereta!

AL: O que o fez se apaixonar pela Opereta, como nasceu essa paixão ? US: Não é fácil, pra dizer a verdade, identificar somente um motivo pelo qual eu me apaixonei pela Opereta. Certamente, naquele momento contingente, o ótimo clima e atmosfera de colaboração e bom humor que respirávamos na Companhia, tiveram o seu peso. Se acrescentarmos a isso a minha índole natural de procurar sempre por positividade e alegria dentro do ambiente de trabalho, acredito ter encontrado na Opereta a justa dimensão para o meu desejo de estar no palco. Tudo isso porque a Opereta é, para todos os efeitos, teatro musical: se canta, se recita, se dança e, diferentemente de outros gêneros teatrais, se “respira” sempre leveza, vivacidade e alegria. O argumento que se coloca em cena jamais é dramático ou trágico: existem muitos momentos líricos (no sentido de intensidade teatral), românticos, sérios, mas jamais trágicos. Tudo isso me estimulou e me fez pensar em iniciar a minha carreira em função da Opereta. Em 2005, tive a grande honra de me tornar o Primeiro Ator (o cômico), Diretor de Cena e Diretor Artístico da “Compagnia Italiana di Operette”, a mais antiga e prestigiada companhia de Opereta da Itália. A partir daquele momento, a carreira prosseguiu num crescendo de satisfações e sucessos. Consegui vencer sempre com muita alegria todos os desafios que esta grande responsabilidade, inevitavelmente, me apresentou. AL: Você trabalhou com muitos cantores líricos? Qual foi a sua experiência como diretor de cena e como colega de cantores líricos? US: Trabalhei com inúmeros cantores líricos, pois, na Opereta, entre os papéis principais, vários são interpretados por cantores líricos. São eles que cantam as melodias mais conhecidas e clássicas e, para tal, é preciso uma preparação vocal lírica. Na Opereta Italiana, os protagonistas são o Cômico e a Soubrette, aos quais não é pedida uma voz lírica, enquanto que os papeis secundários são o tenor e a soprano, ambos cantores líricos. Na Opereta Austro- húngara, por exemplo, todos os personagens são artistas com preparação vocal lírica. Essa diferença entre as duas operetas é atribuída, substancialmente , a origem da Opereta Italiana que é diretamente ligada ao Teatro de Variedades, onde se exibiam cantores/atores com o objetivo principal de entreter com a comicidade, mais do que a arte do canto. Sinceramente, sempre encontrei alguma dificuldade em trabalhar com cantores líricos italianos, devido à pouca preparação na arte de atuar e à deficiência de preparação na dança. Esse problema se evidencia principalmente nas gerações mais maduras, mas os mais jovens também ainda têm uma preparação direcionada quase somente ao canto. AL: O cantor lírico que naturalmente se dedica ao estudo do “Bel Canto”e da ópera vê a Opereta, principalmente na Itália, como um gênero menos importante. O que você pensa em relação a isso? US: É realmente assim: na Itália, a Opereta teve quase sempre menos atenção, justamente porque originou-se das cinzas do Teatro de Variedades, que tinha como força motriz a atuação cômica, não o canto. Esse é o motivo pelo qual muitos cantores líricos a consideram menos importante, uma segunda escolha, enquanto que a Ópera sempre foi e continua sendo o objetivo principal. Porém, na Ópera, não existe a exigência da recitação e da dança por parte dos cantores, por isso ainda hoje muitos Conservatórios na Itália não oferecem esse tipo de preparação ou a oferecem de modo muito superficial. Por esse motivo, quando um cantor lírico se aproxima, por acaso ou por curiosidade, da Opereta, encontra uma grande dificuldade em se adaptar de modo orgânico. O discurso muda radicalmente na Opereta estrangeira, onde a dignidade musical e a partitura necessitam de uma preparação lírica, mas também de uma capacidade de recitar e dançar, e todos os artistas devem apresentar essas qualidades e preparação . Nas grandes produções que tive a sorte e o privilégio de dirigir e interpretar, nas últimas seis temporadas teatrais produzidas pelo teatro “ Al Massimo” de Palermo, do Maestro e Diretor Artístico Aldo Morgante, tive a grande oportunidade de poder me dedicar com atenção à preparação artística do cast lírico, com ótimos resultados. Sendo o forte da minha experiência no Musical e conhecendo as exigências dos cantores líricos, acredito ter contribuído para reconhecimento da Opereta Italiana como Teatro Musical, reaproximando-a do grande público.

"Na Itália, a Opereta teve quase sempre menos atenção, justamente porque originou-se das cinzas do Teatro de Variedades, que tinha como força motriz a atuação cômica, não o canto"

AL: Você acredita que a Opereta possa ser útil e instrutiva para a carreira de um cantor de Ópera? US: Tenho total convicção e sempre tive a demonstração prática disso. Todos os cantores líricos que se aproximaram da Opereta, com quem eu trabalhei, descobriram a possibilidade de se expressar de maneira mais completa. Descobriram também outras dotes pessoais, melhorando consequentemente a expressão vocal, enriquecendo-a de esfumaturas e de profundidade interpretativa, graças à arte da Recitação. Obviamente não viraram bailarinos e nem atores profissionais, já que tanto a Recitação quanto a Dança necessitam do mesmo longo estudo e dedicação, desde muito cedo. Mas, sem dúvida , posso dizer que eles conquistaram maior controle da própria presença no palco e descobriram um novo mundo, melhorando aquilo que já sabiam e conheciam. AL: Como você vê o futuro da Opereta na Europa e no mundo? Você acredita que seja um gênero musical destinado ao esquecimento, como dizem da Ópera lírica na Itália? US: Não, não creio absolutamente. Muito vai depender dos tipos de produções que serão propostas. O público, muitas vezes, precisa ser educado – eu sempre acreditei muito nisso. Se damos ao público produtos de qualidade, sejam eles Ópera, Opereta, Musical, Prosa ou Dança, o público continuará a nos premiar com a sua presença. Não existe uma “data de validade” quando existe qualidade. Eu sempre tentei manter um nível muito alto em meus “produtos”, graças também a investimentos financeiros de produções iluminadas que acreditaram em mim e no meu modo de ver o Teatro em geral e a Opereta em particular. Tudo isso me fez sentir gratificado, principalmente pela grande afluência de público. AL: Que conselho você daria a um jovem cantor lírico curioso em conhecer o mundo da Opereta? US: Estudar recitação e dança, antes de tudo. O meu conselho seria de não pensar que a voz saia de um objeto inanimado: o nosso Corpo existe, o público o vê, a nossa voz canta um texto que é composto por palavras e as palavras expressam conceitos, sentimentos, emoções, pensamentos, sensações. Não é possível ignorar isso, acreditando que seja suficiente ter uma boa voz impostada, os agudos “no lugar”, o timbre límpido ou a respiração correta. Existe um mundo complexo ao redor da voz. Esse é um bom ponto de partida para se aproximar da Opereta para permitir a nossa compreensão, sucessivamente, de um vídeo com grandes produções de Operetas Austro- húngaras, que são as que mais se aproximam da Ópera, musicalmente. Na Europa Oriental e na Rússia, existem grandiosas produções, faraônicas e pomposas, como aquelas da Ópera aqui na Itália.


bottom of page